Sabemos que o Brasil é um dos países que mais possui cirurgiões dentistas. Faz-se necessário, portanto, atualizar-se constantemente para enfrentar os desafios do mercado de trabalho. Nesse contexto, já imaginou se seu paciente chega à consulta e relata que tem interesse em guardar as células-tronco de seu filho? Você tem conhecimento sobre esse assunto? Possui vínculo com algum banco de armazenamento dessas células?
Descobriu-se recentemente que, além de vasos sanguíneos e nervos, a polpa do dente é constituída de células-tronco mesenquimais. As células-tronco, ao contrário das demais células do nosso corpo, têm a capacidade de se transformar em uma ampla variedade de tipos celulares que formam os diferentes tecidos do nosso corpo. Por conta dessa característica, essas células são objeto de intensas pesquisas e podem ser encontradas em diferentes fontes: no interior do embrião, na medula óssea, no tecido adiposo, no sangue do cordão umbilical do recém nascido e, a fonte mais recentemente descoberta, na
polpa do dente.
No Brasil, as células-tronco do tipo mesenquimais estão em fase III de pesquisa (testes clínicos que confirmam a segurança e eficácia do tratamento com grande número de pacientes), sendo estudadas em grandes centros do mundo inteiro para serem utilizadas no tratamento de doenças autoimunes, doenças degenerativas e para atuar na regeneração de tecidos. Grandes centros e universidades investem na pesquisa de células-tronco para tratamento de Diabetes tipo I (USP- Ribeirão Preto), Cirrose (FIOCRUZ), Insuficiência Cardíaca, Infarto e Chagas (Ministério da Saúde com coordenação do InCOR), Trauma de Medula (UNICAMP) e Paralisia Cerebral (PUC-RS).
Em relação às células-tronco retiradas da polpa do dente de leite, os resultados das pesquisas têm sido cada vez mais promissores. Uma pesquisa realizada pela Universidade de São Paulo encontrou resultados bem sucedidos na aplicação dessas células para a produção de uma nova córnea completa! Esse processo foi inicialmente pesquisado em coelhos (devido à semelhança com o olho humano) e, atualmente se encontra na fase final, sendo testado em humanos. Com isto, espera-se que o paciente possa realizar um transplante de córnea sem a necessidade de um doador! No entanto, no Brasil, a aplicação prática dessas células-tronco ainda não é possível de ser realizada normalmente. Aberturas da ANVISA e do Conselho Federal de Medicina permitem que casos isolados sejam autorizados através do Programa do “USO COMPASSIVO”, ou seja, casos sem alternativa terapêutica satisfatória podem receber terapia celular a partir do uso de células-tronco mesenquimais.
Diversas são as vantagens da coleta e armazenamento de células-tronco da polpa do dente de leite: trata-se de uma fonte de células-tronco jovens com maior potencial proliferativo e maior plasticidade (capacidade de diferenciação); tem grande concentração celular; são imunocompatíveis (servem tanto para o doador quanto para a sua família), além da facilidade de obtenção, já que o dente de leite cai naturalmente, ou seja, o processo não é invasivo.
Se o paciente se interessar em coletar e armazenar células-tronco de seu filho, você deve orientá-lo a procurar um banco de armazenamento de células-tronco. O contrato com o banco será mediante um investimento inicial e anual para que as células sejam criopreservadas (preservação das células e tecidos vivos através do nitrogênio líquido) por tempo indeterminado.
Para a coleta desse tipo de célula da polpa do dente de leite é fundamental realizar a exodontia quando o dente estiver esfoliado (mole). A coleta não é inviabilizada em estágios mais avançados de rizólise, desde que o dente apresente tecido pulpar vivo. Além disso, a sua extração deve ser realizada pelo cirurgião-dentista, que deverá conhecer os devidos critérios e cuidados para esse tipo de procedimento e enviar o dente removido ao laboratório especializado, onde o material será processado e armazenado. Vale ressaltar que o terceiro molar (dente do siso) é também fonte de células-tronco viáveis. Sua coleta deve seguir as mesmas orientações da coleta do dente de leite, tendo como requisito que ele ainda não tenha irrompido.
A troca dos dentes de leite faz parte de uma fase muito importante da vida da criança, marcada pela lenda da fada do dente, troca de dente por uma recompensa, brincadeira de jogar o dente no telhado, fotografias familiares da “janelinha”, etc. Porém, infelizmente poucos familiares sabem que aquele dente poderia ser útil para o tratamento de diversas doenças e pesquisas científicas. Nós, profissionais da área da saúde, temos o dever de difundir essas informações e conscientizar a família sobre a importância dessas células que são rotineiramente descartadas.
Talita Pereira Prates é odontopediatra, Graduada em Odontologia e Mestre em Odontopediatria, pela Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo (USP) e atende crianças e pacientes especiais em São Paulo capital, desenvolvendo projetos educativos preventivos em escolas.
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